segunda-feira, 8 de março de 2010

Céu, Sol, Sul, tradição e talento


A música tradicionalista gaúcha perdeu ontem um de seus mais ilustres representantes: o compositor e cantor Leonardo que, em virtude de complicações renais, faleceu às 0h05min, no Hospital de Viamão. Natural de Bagé, Jader Moreci Teixeira tinha 71 anos, sendo 40 de carreira artística, que inclui cerca de 800 músicas gravadas e 41 discos. Há sete anos apresentava o programa "Província de São Pedro", na Rádio Guaíba AM, veiculado aos domingos, das 6h às 8h, cuja última edição foi ao ar em 21 de fevereiro e repetida na programação de ontem.

Autor de sucessos como "Viva a Bombacha", "Batismo de Sal" e "Tertúlia", que ganhou o troféu Calhandra de Ouro da 12ª Califórnia da Canção de Uruguaiana, em 1982, teve "Céu, Sol, Sul, Terra e Cor" eleita por voto popular como a música símbolo do Rio Grande do Sul. Foi vencedor de vários festivais, dentre eles a 3ª Ciranda Musical Teuto-Riograndense de Taquara; a 1ª Guarita da Canção de Torres; e em São Francisco de Paula, o 1º Ronco do Bugio e o Ronco dos Roncos, competição que reuniu todos os ganhadores em dez anos de evento. Cidadão emérito de Viamão, Bom Jesus, Torres, Taquara, Tramandaí e Porto Alegre, foi agraciado inúmeras vezes, com a medalha Personalidade da Sociedade Porto Alegrense, Prêmio Lupicínio Rodrigues e Comenda Laurindo Fernandes do Amaral, de São Leopoldo.

Amigos há mais de 20 anos, a cantora Maria Luiza Benitez, também colega de emissora, conheceu o músico nos anos 70, com quem teve uma convivência muito grande, dividindo muitas vezes o mesmo palco, sendo jurados de festivais e tendo em comum a atividade de terapeutas holísticos, na área de reiki.

Ela exalta suas qualidades como produtor musical, especialmente quando trabalhou com Adair de Freitas e Gaúcho da Fronteira, no grupo Os Vaqueanos, e quando atuou na gravadora Isaec. "Leonardo produziu um monte de músicos e fazia música pra muita gente. Fazia jingle para cada cidade e suas músicas viravam hinos", afirma. "Ele era extremamente alegre, contava uma piada em cima da outra. Não tinha nenhum pingo de tristeza, nunca o vi com cara triste, e estava sempre pra cima", declara saudosa sobre o amigo, que sabia ser portador de diabetes em grau muito avançado.

Para o músico e ex-secretário estadual da Cultura, Vitor Hugo, Leonardo era um artista versátil, que deixa uma obra muito extensa, em várias ramificações da música regional. "O Leonardo era aquele cara que nasceu especialmente pra fazer música, com uma facilidade enorme de expressar sentimentos em forma de canção", declara, mencionando o início de carreira do artista, na dupla Leopoldo e Leonardo.

Letras para a eternidade

O folclorista Paixão Côrtes mantinha com Leonardo uma convivência muito íntima, tendo sido padrinho de seu conjunto Os Três Xirus, com quem viajou pelo Brasil e Uruguai. "Foi um grande compositor, excelente cantor, violonista de magnífica qualidade e com capacidade de focar os mais variados temas, desde os aspectos galponeiros até as coisas mais sublimes do Rio Grande do Sul", diz sobre o amigo, a quem classifica um compositor não afeito ao consumismo e imediatismo. Para ele, a exaltação à natureza e à beleza de nossa terra o projetava nos mais variados segmentos culturais.

Com Os Três Xirus, foi ao Cassino Estoril, em Lisboa e à Feira de Santarém, também em Portugal, ocasião registrada no livro "O Rio Grande Canta e Dança Paixão Côrtes". Fez questão de gravar "Lamento de um Gaúcho", do compositor, somente ao violão, "por considerar grandiosa de alma, maior que qualquer efeito sonoro". Estiveram juntos em várias festividades maçônicas e Leonardo sempre conquistava o público por onde passava, pela simpatia e dignidade. "Quando menos se esperava, ele aparecia com uma letra maravilhosa", conta Côrtes, que quando lançou a Califórnia da Canção, como presidente, contratou Os Três Xirus para acolherem os letristas e compositores que não tinham músicos. "Era uma pessoa simples, que não era medíocre, e tinha visão grandiosa. Certamente quem vai se deliciar com suas músicas serão as novas gerações, pois ele compunha pra eternidade", acrescenta emocionado.
 
A divulgação do Rio Grande nas ondas da Rádio Guaíba AM

No dia 6 de abril de 2003 estreava na Rádio Guaíba o programa "Província de São Pedro", com apresentação de Leonardo e produção de seu filho, Jader Teixeira, que era gravado nas quintas-feiras e ia ao ar aos domingos. O compositor e cantor tinha uma responsabilidade e tanto pela frente, ao substituir Paixão Côrtes no primeiro programa gauchesco da emissora, "Domingo com Paixão Côrtes", veiculado durante 24 anos.

A desenvoltura e a capacidade de comunicação foram adquiridas muito antes de incursionar pela música, quando o artista e comunicador atuou como palhaço, sob o apelido de Zé Sabugo, em sua terra natal. No programa de rádio, atendia pedidos de ouvintes, que ligavam e escreviam solicitando músicas; falava de eventos nativistas que aconteciam pelo Rio Grande do Sul e valorizava o trabalho de nossos artistas, fazendo vários tipos de homenagens: ao rio Gravataí, a Erechim e a Porto Alegre, entre outros agraciados. De acordo com o Gerente de Jornalismo da Rádio Guaíba, Ataídes Miranda, era conhecido pela "simplicidade e humildade. Embora talentoso, nunca deixou o sucesso subir à cabeça". De opiniões fortes, se engajou no movimento das "Diretas Já" e fez campanha aberta ao Partido dos Trabalhadores, cantando na campanha e também no Fórum Social Mundial. Mas é pelo bom humor que ele sempre será lembrado e que vai deixar saudades em colegas, como o operador de gravação da rádio, que atuou ao seu lado por dois anos, Jefferson Gomes: "Foi muito bom conhecer o Leonardo, que era muito legal. A convivência era muito boa, quando ele chegava já mudava o clima, pois estava sempre brincando", afirma o Gomes.

Fonte! Chasque publicado no Correio do Povo de Porto Alegre - RS, na edição do dia 08 de março de 2010 - http://www.correiodopovo.com.br/.

Créditos dos retratos:
1 - Luis Gonçalves / CP Memória
2 e 3 - Ricardo Giusti / CP Memória

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